Fundador da República da China (Cuiheng 翠亨, 12 de Novembro de 1866 – Pequim [Beijing 北 京], 12 de Março de 1925). Do século XVI ao XVIII, europeus e chineses dedicaram-se ao comércio, com vantagens para ambas as partes, usando as vias do diálogo e da diplomacia na procura de soluções. No século XIX tudo se alteraria. A Europa tornou-se forte e arrogante e a intervenção dos ocidentais passou a ser brutal. O exemplo da vasta Índia inglesa despoletava ambições. E não faltaram oportunidades para esquartejar a imensa China: a guerra do ópio (1840-1842), a revolução nacionalista e xenófoba dos Tai Ping 太 平 (1850-1864), a II guerra sino-japonesa (1894- 1895), o movimento nacionalista dos Boxers (1900), a guerra russo-japonesa (1904-1905). Ao iniciar o século XX, o Império do Meio via-se desapossado de importantes porções do seu território, desmantelado economicamente e humilhado por uma série de tratados que designou, não sem razão, ‘tratados iníquos ou tratados desiguais’. Estava assim preparado o terreno para a gestação de um núcleo duro de nacionalistas revolucionários, que se organizaram em sociedades secretas – umas já com ideais republicanos, outras ainda monárquicas – lançando as raízes do primeiro movimento revolucionário da China moderna, que seria provisoriamente encabeçado por Sun Yat- Sen (Sun Yixian 孫逸仙). O fundador da República Chinesa nasceu a 12 de Novembro de 1866, numa aldeia rural, Cuiheng 翠亨, 30 km a norte de Macau, distrito de Xiangshan (香山), actual município de Zhongshan 中山 – berço de inúmeros chineses ultramarinos. Criança pobre, com 5 irmãos, Sun ajudava o avô na apanha de ostras e o pai nas lides da lavoura. ‘Sou cule e filho de cules’, declararia mais tarde, recordando a China semi-colonial e semi-feudal da sua infância. Em Maio de 1878, com 11 anos de idade, passou por Macau, pela primeira vez, acompanhado da mãe, rumo ao Hawai, onde o irmão mais velho, Sun Mei 孫眉, ali emigrado, lhe custearia os estudos no Iolani College, da English Methodist Church, em Honolulu. Em 1883, prosseguiu a sua educação ocidental em Hong Kong, onde também se baptizou no protestantismo. Aos 18 anos, casou com Lu Muzhen 盧慕貞. Em Junho de 1892 licenciou-se em medicina e cirurgia, pelo College of Medicine for Chinese, de Hong Kong, e transferiu-se para Macau, onde iniciou, em Setembro desse ano, a sua carreira de médico, no hospital de Kiang Wu (Jinghu Yiyuan 鏡湖醫院), tornando-se o primeiro médico chinês a praticar ali medicina ocidental. Impedido de prosseguir a sua carreira em Macau, voltou para Hong Kong, em 1893, e ali, na Casa Vermelha, perto do Castle Peak, conspirou para derrubar a dinastia manchu. Seguiu para o interior da China, onde, entre 1895 e a instauração da república, dirigiu nove revoltas, nas províncias de Guangdong 廣東 e Guangxi 廣西. Em Novembro de 1895, por ter abortado a primeira insurreição armada que organizara em Guangdong 廣東, fugiu para Macau e, com a ajuda de um amigo macaense, Francisco Hermenegildo Fernandes, embarcou para Hong Kong e dali para o Japão, prosseguindo uma carreira de revolucionário profissional, com deslocações à Inglaterra e aos Estados Unidos. Em Agosto de 1905, fundou em Tóquio a “Liga Unida da China”, republicana, que rapidamente adquiriu importância no Império do Meio e, com o apoio das comunidades chinesas da América, esteve directamente ligada à revolução que, em 10 de Outubro de 1911, derrubou a dinastia Qing 清. Em 29 de Dezembro do mesmo ano, foi eleito pelos representantes de 17 Províncias, Presidente Provisório da República da China. Em 1 de Janeiro do ano seguinte, foi proclamada oficialmente, em Nanquim, a República da China, tendo o Dr. Sun tomado posse do cargo, com um governo também provisório. A revolução abortou de imediato e foi forçado a demitir-se, logo em 13 de Fevereiro, um dia depois da abdicação do imperador manchu, Pu Yi 溥儀. Em Beijing 北京 dominava Yuan Shikai 袁世凱, tentando restaurar o antigo regime monár quico. Quando a China mergulhava de novo na anarquia, Sun Yat-Sen (Sun Yixian 孫逸仙) passou por Macau, onde não voltara desde que aqui fizera escala, em fuga para o exílio, em 1895. Desta vez vinha em trânsito, de Hong Kong para a sua terra natal. Chegou a 24 de Maio de 1912, e permaneceu até 27, alojandose no palacete de Lou Lim Ioc (Lu Lianruo 盧廉若), seu apoiante e amigo. Encontrou-se com o Governador e com outras personalidades, que lhe organizaram uma recepção solene, e visitou o hospital de Kiang Wu (Jinghu Yiyuan 鏡湖醫院, antes de seguir para a sua terra, Cuiheng 翠亨, que não visitava havia 17 anos. Voltaria a passar por Macau em 16 de Junho do ano seguinte, vindo de Xangai, onde defendera o derrube de Yuan Shikai 袁世凱 (que pretendia fazer-se coroar imperador), e preparara a “Segunda Revolução”. Ficou então instalado em casa do irmão mais velho, Sun Mei 孫眉, na Rua Central, e seguiu para Hong Kong, a 24. Nesta visita, realizou encontros diversos, para acelerar a proclamação da independência da província de Guangdong 廣東. Com a morte de Yuan Shikai 袁 世凱, em 16 de Junho de 1916, Sun Yat-Sen (Sun Yixian 孫逸仙) tentou restaurar a constituição provisória de 1912 e, por essa causa, criou, em Julho de 1917, o Governo Militar de Guangdong 廣東. Aproveitou também para se encontrar com a sua filha mais velha, gravemente doente. A jovem Sun Ting 孫蜓, que havia partido para os Estados Unidos em 1912, com os dois irmãos Sun Fo (Sun Ke 孫科) e Sun Wan 孫婉, para estudar, regressara entretanto a Macau por sofrer de doença renal grave, da qual viria a falecer a 25 daquele mês de Junho de 1913, um dia depois da partida do pai para Hong Kong. Sun Yat-Sen (Sun Yixian 孫逸仙) não voltaria a Macau, cidade que continuaria a ser uma importante base para as actividades dos seus correligionários. As revoltas continuaram, até à unificação empreendida por Jiang Jeshi 蔣介石 (que viria a casar com uma irmã da terceira mulher de Sun), e posteriormente consumada por Mao Zedong 毛澤 東 . Morreu de cancro no fígado, em Beijing 北京, em 12 de Março de 1925. Sun Yat-Sen (Sun Yixian 孫逸仙) deixou dois testamentos: um dirigido aos seus correligionários do Guomindang 國民黨, partido nacionalista que fundara e que, após a sua morte, seria dirigido por Jiang Jeshi 蔣介石 (a última e veemente recomendação referia-se à abolição dos tratados iníquos) e outro dispondo dos seus bens (“O que eu deixo são livros, roupas e a minha casa, indo tudo para minha mulher como recordação”). Em instruções à esposa terá manifestado a vontade de ser embalsamado, colocado numa urna semelhante à do seu amigo Lenine, que falecera um ano antes, e enterrado no Monte do Tigre, em Nanquim, onde jaz. Alguns dias após a sua morte, relizou-se no hospital Kiang Wu (Jinghu Yiyuan 鏡湖醫院) uma grandiosa homenagem em sua memória, na qual terão participado cerca de 20.000 pessoas, das 100.000 que então habitavam nesta cidade. Macau era a terra adoptiva da família do Dr. Sun. O irmão mais velho, Sun Mei 孫眉, a primeira mulher, Lu Muzhen 盧慕貞, e os três filhos, aqui viveram e alguns aqui faleceram, factos que afirmam o apreço que o fundador da república chinesa nutria por esta cidade. Testemunho perene da ligação de Sun Yat-Sen (Sun Yixian 孫逸仙) a Macau, são três grandes estátuas, um busto, e uma Casa-Museu: Sun Yat-Sen Memorial Hall. A nenhum herói Macau erigiu tanto mármore e tanto bronze como ao “Pai da Pátria”: assim é conhecido o fundador da República e primeiro grande revolucionário da China moderna, que abriu caminho para o nacionalismo de Jiang Jeshi 蔣介石 e para o comunismo de Mao Zedong 毛澤 東. [A.G.A.]
Bibliografia: ARAÚJO, Amadeu Gomes de, “Sun Yat-Sen em Macau: a Casa-Museu e as Estátuas”, in
MacaU, n.º 87, (Macau, Julho 1999), pp. 38-42; BOORMAN, L. Howard,
Biographical Dictionary of Republican China, (Nova Iorque, 1970); GUEDES, João, “Sun Iat Sen, Macau e a Revolução”, in
Revista da Cultura, n.º 16, (Macau, 1991), pp. 63-95; ZHENG Lei; SHENG Yunhua; FOK Kai Cheong,
Macau: Portal e Palco por onde Sun Yat-Sen Ganhou Acesso ao Mundo, (Macau, 1996).
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