Tomé Pires era boticário de profissão e embarcou para o Oriente em 1511, como encargo de seleccionar as drogas que deveriam ser enviadas para Portugal. Após alguns meses de residência em Cananor, o governador Afonso de Albuquerque envia-o a Malaca em meados de 1512, atribuindo-lhe nos anos imediatos diversas funções relacionadas como comércio de drogas e especiarias da Insulíndia. Em princípios de 1515 voltou à Índia, na posse de uma razoável fortuna, com planos para regressar definitivamente a Portugal. Entretanto, nos portos do Indostão, Tomé Pires conclui a redacção da Suma oriental, um extenso e bem informado tratado de geografia, onde descrevia com enorme riqueza de pormenores grande número de regiões e de povos da Ásia marítima, desde as margens do Mar Vermelho, nas cercanias do Mediterrâneo, até aos mais longínquos arquipélagos dos Léquios e do Japão. Dotado de um singular poder de observação, de uma curiosidade insaciável e de evidentes capacidades inquiridoras, o nosso autor conseguiu reunir em escassos anos um prodigioso conjunto de dados sobre muitos temas orientais até então perfeitamente desconhecidos dos europeus (portos, mercadorias, preços, pesos e medidas, hábitos e costumes, organização política, crenças, etc. ). O seu trabalho de compilação de notícias ligava-se de forma íntima ao projecto albuquerquiano de consolidar a presença portuguesa nos mares asiáticos, plano esse que exigia um apurado conhecimento do terreno, em termos geográficos, económicos, políticos e religiosos. A Suma oriental inclui a primeira descrição da China registada por um observador português. Tomé Pires revela alguma surpresa – que indicia a absoluta novidade das suas informações – ao descrever a fama de que gozava o Celeste Império entre os povos da Ásia Oriental, mas nem por isso deixa de apontar elementos de natureza mercantil, lado a lado com dados sobre as principais características da civilização chinesa. Entre muitas outras novidades, o boticário português refere-se ao porto de “Oquem”, que a crítica histórica tem identificado como a primeiríssima referência portuguesa, e europeia, ao local onde mais tarde se viria a desenvolver o estabelecimento luso-chinês de Macau. O autor da Suma oriental, curiosamente, haveria de ser o primeiro embaixador português enviado a Pequim (Beijing 北京). Com efeito, quando em 1515 se preparava para regressar a Portugal, foi destacado pelo governador da Índia, então Lopo Soares de Albergaria, para chefiar uma missão diplomática ao Celeste Império. A embaixada desembarcou em Cantão em 1517, mas, depois de uma rápida visita à capital imperial, em princípios de 1521, os seus membros acabaram por ser detidos pelas autoridades cantonenses, numa altura em que ocorreram os primeiros confrontos entre portugueses e chinesas. Anos mais tarde, o viajante e escritor português Fernão Mendes Pinto, na sua Peregrinação (Lisboa, 1614), afirmaria ter encontrado durante as suas alegadas andanças pelo interior da China uma cristã chinesa chamada Inês de Leiria, que seria nada mais nada menos que a filha de Tomé Pires. Estas alegações, contudo, não são confirmadas por outros documentos. O embaixador Tomé Pires, segundo se pensa, veio a desaparecer em circunstâncias ainda não esclarecidas, num cárcere de Cantão, por volta de 1527. [R.M.L.]
Bibliografia: CORTESÃO, Armando, A Suma Oriental deTomé Pires e o Livro de Francisco Rodrigues, (Coimbra, 1978) ;LOUREIRO, Rui Manuel, O Manuscrito de Lisboa da ‘Suma Oriental’ de Tomé Pires, (Macau, 1996); LOUREIRO, Rui Manuel, “A Malograda Embaixada de Tomé Pires a Pequim”, in ALVES, Jorge Manuel dos Santos (coord.), Portugal e a China –Conferências no II Curso Livre de História das Relações entre Portugale a China (Séculos XVI-XIX) , (Lisboa, 1999), pp. 39-55.

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Data de atualização: 2022/11/03