Contra-almirante francês que começa a sua carreira como botânico e linguista e, em 1807, integra a tripulação do l’Aquillon, na qual iniciará a sua formação profissional como ‘noviço’, até se tornar aspirante em 1809. Em 1821, sendo já tenente, planeia, juntamente com Louis Isadore Duperrey, uma expedição científica aos oceanos Atlântico e Pacífico, que vem a acontecer a bordo da corveta Coquille, comandada por este último, e tendo d’Urville como segundo comandante. A viagem inicia- se em 11 de Agosto de 1822 e dura três anos, chegando a Marselha em 24 de Janeiro de 1825. D’Urville parte de novo, em 25 de Abril de 1826, encarregue de encontrar o paradeiro da expedição do conde de Lapérouse, desaparecida há cerca de trinta e oito anos durante a sua circum-navegação. A Coquille é rebaptizada L’Astrolabe em honra ao barco de Lapérouse e, num recife das ilhas Vanikoro, a tripulação descobre os destroços da embarcação que lhe dera nome, regressando a Marselha em 25 de Março de 1829. A narrativa da viagem é ordenada e paga pelo ministro da Marinha, sendo publicada em Paris, no ano de 1835: Voyage de la corvette l’Astrolabe éxécuté par ordre du roi, pendant les années 1826, 1827, 1828, 1829 (13 vols.). Aos cinquenta anos, e após a sua última viagem, em 1840, o já contra-almirante d’Urville recebe, da Sociedade de Geografia francesa, uma medalha de ouro. Na obra Voyage pittoresque autour du monde. Resumé Général des voyages de découvertes publié sous la direction de M. Duont d’Urville, capitaine de vaisseau..., o navegador resume a sua estada em Macau, começando, tal como muitos outros visitantes, por descrever a população marítima e fluvial que observa à chegada ao enclave, onde avista, desde logo, os conventos, os fortes, acabando, com um certo pendor lírico, por personificar as habitações: “as casas de Macau descem até ao mar”. O viajante descreve posteriormente, tal como a maioria dos visitantes franceses que se devem influenciar entre si nos relatos de viagens, o ancoradouro da Taipa, a localização e o relevo da península, bem como a história do estabelecimento dos portugueses dentro da muralha com que os chineses delimitam o espaço luso de comércio e residência no Império do Meio. Desconhecendo o final do comércio da nau de trato, d’Urville, tal como muitos outros seus compatriotas que visitam o enclave, dá como causa da decadência do comércio português local apenas a chegada dos rivais norte-europeus a Cantão, afirmando que os energéticos e empreendedores chineses construíram Macau. É também abordado o poder das autoridades mandarínicas que podem isolar a cidade, suspendendo o comércio e a entrada de víveres na mesma, poder esse que exercem sobre os portugueses, descrevendo o autor, à semelhança do relato de Laplace (1793- 1875), um conflito originado por um árabe doente e que envolve as autoridades sínicas. Mal desembarca, a tripulação pede guarida a um comerciante norte-americano e passeia pela Praia Grande, descrevendo, o texto, a mesma, bem como as construções de prestígio que se avistam. No dia seguinte, a tripulação almoça com um inglês num local que “cheira a perfume de poesia antiga”, o quiosque ou pequeno observatório no Jardim da Gruta de Camões, e visita as fortalezas. São referidas a guarnição militar do território, as lojas e os cemitérios chineses, a lei chinesa em caso de homicídio, algumas igrejas, os hospitais, as sinuosas e estreitas ruas do enclave e São Paulo. Traça-se ainda um quadro sobre a missionação francesa e a arte de enganar o cliente, esta demonstrada pelos vendedores do mercado chinês. Seguidamente, o autor fala sobre os portugueses que habitam as feitorias “fundadas por Albuquerque e por Andrade”, a miscegenação, o vestuário, a tez e a fisionomia de mulheres e homens. Relativamente às mulheres de Macau, antipáticas e reservadas, o autor refere o uso do dó e a aparência. D’Urville, tal como muitos outros visitantes estrangeiros, enumera também os pássaros do aviário de Thomas Beale, antes de relatar um passeio até à Taipa e uma festa chinesa por entre tambores, bandeirolas, templos, capelas e marinheiros que prestam culto às suas divindades (Voyage pittoresque..., 1834-1835, pp. 275-287). O texto menciona ainda as “chinesas aportuguesadas” e o facto de os chineses venderem as suas filhas aos portugueses, acabando as mestiças por trabalhar nos opiários. A importância do comércio do ópio para Macau antes da utilização sistemática de Lintim é também referida, bem como os seus elevados lucros financeiros. O autor não esquece também o parco comércio português, a actividade das alfândegas portuguesa e chinesa, bem como a actividade do mandarim da Casa Branca e do governo português do território. Uma outra presença observada no enclave são os mercadores europeus e norte-americanos, que aí se estabelecem entre as “épocas comerciais” de Cantão e constroem e arrendam luxuosas moradias. [R.M.P.] Bibliografia: DEZOS, Jean Bernard Marie Alexandre, Notice Nécrologique sur Dumont d’Urville, Contre-amiral et Navigateur Français, (Paris, 1855); Soudry A., Dumont d’Urville, (Paris, 1886); HULOT, Baron Etienne, Le Contre-amiral Dumont d’Urville, (Paris, 1892); VERGNIOL, Camille, Dumont d’Urville, (Paris, 1930); DAY, George, Dumont d’Urville, 1790- 1842, (Paris, 1947); ASTORKIA, Madeline, Autour de Láperouse: les Voyages de Dumont d’Urville, Caisse d’Épargne, Toulon, 22 Octobre-20 Décembre 1985: Conception de l’Exposition et Catalogue, (Toulon, 1985); ASTORKIA, Madeline, Jules Sébastien César Dumont d’Urville, 1790-1842: Textes et Documents, Service Historique de la Marine-Centre de Documentation et de Recherche de la IIIe. Région Maritime, (Toulon, 1985); GUILLON, Jacques, Dumont d’Urville: 1790-1842, (Paris, 1986); McLAREN, Ian Francis, Lapérouse in the Pacific: Including Searches by d’Entrecasteaux, Dillon, Dumont d’Urville: An Annotated Bibliography, (Parkville, 1993); ROLLAND, Thomas Pierre, Any Port in a Storm: from Provenance to Australia: Rolland’s Journal of the Voyage of La Coquille (1822-1825) , (Townsville, 1993); HUNT, Susan et alii, Lure of the Southern Seas: The Voyages of Dumont d’Urville 1826-1840, (Sidney, 2002); URVILLE, Jules Sebástien César Dumont d’, Voyage Pittoresque autour du Monde. Resumé Général des Voyages de Découvertes Publié sous la Direction de M. Duont d’Urville, Capitaine de Vaisseau, Accompagné de Cartes de Nombreuses Gravures en Taille-douce sur Acier, d’aprés les Dessins de M. de Sainson, Desinateur du Voyage dl’Astrolabe, 2 vols., (Paris, 1834-1835); URVILLE, Jules Sebástien César Dumont d’, Voyage de Découvertes de l’Astrolabe: Exécuté par Ordre du Roi, pendant les Années 1826-1827-1828-1829, sous le Commandement de M. J. Dumont d’Urville, Capitaine de Vaisseau, (Paris, 1833-1834); URVILLE, Jules Sebástien César Dumont d’, An Account in Two Volumes of Two Voyages to the South Seas by Captain (Later Rear-Admiral) Jules S. C. Dumont d’Urville of the French Navy to Australia, New Zealand, Oceania, 1826-1829 in the Corvette Astrolabe and the Straits of Magellan, Chile, Oceania, South East Asia, Australia, Antarctica, New Zealand, and Torres Strait, 1837-1840 in the Corvettes Astrolabe and Zélée, (Honolulu, 1988); URVILLE, Jules Sebástien César Dumont d’, The New Zelanders: A Story of Austral Lands, (Wellington, 1992).
Comentários
Comentários (0 participação(ões), 0 comentário(s)): agradecemos que partilhasse os seus materiais e histórias (dentro de 150 palavras).