Informações relevantes
Data de atualização: 2020/04/16
Surgimento e mudança da Ribeira Lin Kai de San Kio
Macau e a Rota da Seda: “Macau nos Mapas Antigos” Série de Conhecimentos (I)
Escravo Negro de Macau que Podia Viver no Fundo da Água
Que tipo de país é a China ? O que disseram os primeiros portugueses aqui chegados sobre a China, 1515
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CLEVELAND, LUCY HILLER (1780-1866). Viajante, poetisa, autora de livros infantis, desenhadora, diarista, artista têxtil (1830-1865) e reformista social oriunda de Salem, Massachusetts e filha mais nova do major Joseph Hiller (1748-1814), relojoeiro que luta na Guerra Civil, e de Margaret Cleveland Hiller (1748-1804). Em 1803, o major Hiller muda-se, com a família, para Lancaster (Massachusetts), onde Lucy casa com o capitão William Lambert of Roxbury em Julho de 1806, enviuvando um ano depois, quando o marido morre na Holanda, em Agosto de 1807. Lucy regressa a Lancaster para viver com as suas irmãs mais velhas, Dorcas (1773-1850) e Mary (1779-1815), que haviam casado, respectivamente, com os irmãos Richard Jeffrey Cleveland (1773-1860) e William Cleveland (1777-1842), mercadores de Salem e que são primos em primeiro grau das mulheres, sendo estes casamentos estimulados de forma a preservar a riqueza e a influência das famílias locais. O pai de Lucy morre em 1814, seguindo-se-lhe a irmã Mary, no ano seguinte, servindo a primeira, viúva e sem filhos, como acompanhante de senhoras na sua família. Em 1816, Lucy casa com o cunhado viúvo, o capitão William Cleveland, tornando-se madrasta dos seus sobrinhos, prática comum entre os unitarians, segundo Harriett Low. O casal muda-se para Salem em 1821, sem nunca ter filhos. William dedica-se e novo ao comércio marítimo, enquanto a sua mulher escreve cerca de doze livros infantis. Em 29 de Outubro de 1828, Lucy e o seu enteado James Cleveland deixam Salem e, em 18 de Novembro de 1828, partem a bordo do Zephyr, para acompanhar o marido até Timor, onde este se desloca com o intuito adquirir sândalo para comercializar na China. A viagem dura cerca de um ano, terminando em 27 de Setembro de 1829. A viajante redige um breve diário da viagem e ilustra um sketchbook com duas dezenas de desenhos coloridos de Timor (7) e de Macau (13), onde visita a jovem Harriett Low, em 1829, desenhando e pintando, tal como George Chinnery e W. W. Wood, várias cenas do quotidiano macaense oito-centista, entre os quais “Apew” (Apun); o boy do lar da família Low; uma chinesa de pés enfaixados; uma mulher portuguesa a caminho da igreja, coberta pelo véu e acompanhada por um empregado; cules a carregar cadeirinhas aos ombros; um barbeiro e (três) jogadores chineses sentados no chão. De acordo com o seu diário, a cansativa viagem entre Timor e o enclave dura trinta e dois dias, chegando a diarista cansada à Rada de Macau em 12 de Outubro de 1829. A autora deixa de escrever até 8 de Janeiro de 1830, dia em que abandona Macau, observando-se portanto uma elipse na narrativa. Em 12 de Outubro de 1829, Harriett Low descreve, no seu diário, o primeiro encontro com Mrs. Cleveland, sua conterrânea, e com o seu marido, passeando com a recém-chegada, sua hóspede, pelas ruas de Macau, ouvindo-a tocar guitarra, observando jogos que esta lhe ensina e fazendo-lhe companhia devido à sua prolongada doença, enquanto o marido se desloca a Cantão, em negócios. Em 8 de Janeiro de 1830, o casal Cleveland deixa Macau, trocando Lucy correspondência com a jovem Low. Bibliografia: “Lucy Cleveland Papers” e “William S. Cleveland Papers”, Peabody Essex Museum: Phillips Library (Salem); CLEVELAND, Lucy, “Sketchbook”, cota: M1347, The Peabody Essex Museum, Phillips Library; CLEVELAND, Lucy, “Voyage of the Zephyr, 1829”, cota: MS 656 1829Z, The Pe¬abody Essex Museum, Phillips Library; CLEVELAND, Richard J., A Narrative of Voyages and Commercial Enterprises, (Cambridge, 1842); MARVIN, Reverend Abijah P., History of the Town of Lancaster, Massachusetts, (Lancaster, 1879); CLEVELAND, Edmund Janes; CLEVELAND, Horace Gillette (eds.), The Genealogy of the Cleveland and Cleveland Families, (Hartford, 1899); CARRICK, Alice Van Leer, “Playthings of the Past”, in Antiques, (Janeiro de 1922), pp. 10-16; PAYSON, Huldah Smith, Museum Collections of the Essex Institute, (Salem, 1978); LAHIKAINEN, Dean, In the American Spirit: Folk Art from the Collections, (Salem, 1994); RICHTER, Paula Bradstrees, “Lucy Cleveland’s ‘Figures of Rags’: Textile Arts and Social Commentary in Early-Nineteenth-Century New England”, in BARNES, Peter (ed.), The Dublin Seminar for New England Folklife. Annual Proceedings 1997 Textiles in Early England: Design, Production, and Consumption, (Boston), pp. 48-63; RICHTER, Paula Bradstrees, “Lucy Cleveland, Folk Artist”, in Antiques: The Magazine, (Agosto de 2000), pp. 204- 213; LOW, Harriett, Lights and Shadows of a Macao Life: The Journal of Harriet Low, Travelling Spinster – Part One: 1829- 1832 e Part Two: 1832-1834, 2 volumes, (Woodinville, 2002); PUGA, Rogério Miguel, “Macau e Timor em 1829: O Diário e os Desenhos Inéditos de Lucy Cleveland”, Oriente (Lisboa, (2006).
CLEVELAND, LUCY HILLER (1780-1866).
BRAGA, MARIA ONDINA SOARES FERNANDES (1932-2003). Maria Ondina Soares Fernandes Braga nasceu em Braga em 1932 e estudou na Alliance Française em Paris, licenciando-se em língua inglesa pela Royal Asiatic Society of Arts de Londres. Foi professsora de Inglês e de Português em Angola, Goa e Macau, residindo em Lisboa desde 1965. Macau e a China estão bem patentes na obra da escritora, que viveu em ambos os locais: entre 1961 e 1965 em Macau, onde foi professora no Colégio Santa Rosa de Lima, e em 1982, em Pequim, tendo leccionado na Secção de Português do Instituto de Línguas Estrangeiras. Em 1965 publicou o seu primeiro livro, Eu Vim para Ver a Terra, no qual reune crónicas de Angola, Goa e Macau. Três anos depois é a vez de dar à estampa alguns contos de inspiração chinesa, escritos em Macau, na obra A China Fica ao Lado, com diversas edições, e traduzida para chinês em 1991. Nesse mesmo ano publicou Nocturno em Macau, obra galardoada com o Prémio Eça de Queirós, da Câmara Municipal de Lisboa. A notória ligação de Ondina Braga à China passa ainda pelo facto de, mesmo a sua autobiografia romanceada, que mais tarde viria a constituir o livro Estátua de Sal, ter sido escrita em Macau (1963), sem, naturalmente, deixar de referir a sua Angústia em Pequim, publicada em 1984. Ciclo este da vida da escritora de alguma forma fechado com Passagem do Cabo (1994), em que, tal como no seu primeiro livro, reune crónicas de Angola, Goa e Macau, sendo, no entanto, patente uma postura de despedida dessas terras que viu. Em Março de 1990, Ondina Braga voltou a Macau, o que se repetiria no ano seguinte, por ocasião do lançamento da versão bilingue de A China Fica ao Lado. As impressões que então colheu da terra que lhe fora tão familiar estão registadas em diversos artigos, crónicas e entrevistas publicados na imprensa local e nacional, de que também foi colaboradora assídua. No Território, Ondina Braga tem publicação dispersa, ao nível literário e ensaístico, nomeadamente na Revista de Cultura e na Macau. Sendo uma das contistas portuguesas mais prestigiadas e galardoadas da actualidade, Maria Ondina Braga, desenvolveu, com igual êxito, a novela, a crónica, a narrativa, a biografia, o ensaio e a tradução. A sua colectânea de contos, A Filha do Juramento, composta por três livros, sendo o segundo deles dedicado à China, publicada em 1995 na cidade de Braga, assinalou a passagem do 30.° aniversário da carreira literária da autora que, entretanto, retomou a vertente autobiográfica e memorialista ficcionada em Vidas Vencidas. – Principais Obras. Romances: Nocturno em Macau, 1991 (2.ª ed., 1993); A Personagem, 1978. Contos: A China Fica ao Lado, 1968 (4.ª ed., 1991); Amor e Morte, 1970; A Revolta das Palavras, 1975; A Filha do Juramento, 1995. Crónicas: Eu Vim para Ver a Terra, 1965; Passagem do Cabo, 1995. Novelas: Os Rostos de Jano, 1973; A Casa Suspensa, 1982; Lua de Sangue, 1986. Narrativa: Angústia em Pequim, 1984 (2.ª ed., 1988). Autobiografias e memórias romanceadas: Estátua de Sal, 1969 (3.ª ed., 1983); Vidas Vencidas, 1999. Publicação de conjunto: A Rosa-de-Jericó (contos escolhidos), 1992. Bibliografia: SENA, Tereza; BASTO, Jorge, Macau nas Palavras, (Macau, 1998).
BRAGA, MARIA ONDINA SOARES FERNANDES (1932-2003)
ANSON, BARÃO GEORGE (1697-1752). Almirante cuja rota da circum-navegação (1740- 1744) passa por Macau. Entre outras façanhas, Anson derrota a frota francesa no Cabo Finisterra em 1747, e, enquanto First Lord of the Admiralty (1751-1756, 1757-1762), leva a cabo importantes reformas navais, contribuindo para o sucesso de Inglaterra na Guerra dos Sete Anos (1756-1763). Após cerca de dois anos de viagem, em 12 de Novembro de 1742, encontrando-se apenas quatro embarcações da EIC no Sul da China, chega à rada de Macau, com o intuito de se reabastecer, o primeiro barco de guerra da Marinha Real inglesa, o H. M. Centurion, sob o comando de George Anson, que partira de Southampton em 18 de Setembro de 1740 para desequilibrar os interesses espanhóis, sobretudo no continente americano. Um dos membros da tripulação descreve a chegada à Taipa e o poder (cada vez mais nominal) dos portugueses em Macau. O enclave funciona como porto familiar e seguro durante longas viagens de embarcações europeias. Na China Meridional inúmeros barcos europeus necessitam de se reabastecer e de ser reparados, como é o caso do Centurion. O capitão inglês do Augusta, barco da EIC, informa Anson dos procedimentos habituais dos estrangeiros à chegada a Macau, nomeadamente o pedido de autorização às autoridades chinesas para entrar no rio de Cantão e as taxas alfandegárias que o Centurion teria que pagar, aconselhando o Comodoro a informar-se melhor junto do governador e do Senado de Macau, que, temendo represálias chinesas como as que a cidade sofrera ao receber o London e outras embarcações inglesas, aconselha Anson a atracar discretamente na Taipa e a não entrar no rio das Pérolas, pois caso o fizesse teria de pagar as taxas alfandegárias ao mandarinato cantonense. Os portugueses servem, mais uma vez, de fonte de informação sobre a China para visitantes estrangeiros, deslocando-se Anson, no segundo dia da sua estada, a terra para inquirir o governador sobre as possibilidades de adquirir mantimentos e reparar o barco. Este último responde que se vê forçado a pedir autorização às autoridades mandarínicas e, perante tal postura, o Comodoro, apercebendo-se de que apenas o vice-rei de Cantão poderia autorizar o reabastecimento e a reparação do Centurion, aluga um pequeno junco e dirige-se para Cantão, onde, após aconselhar-se junto dos sobrecar¬gas da EIC aí instalados, tenta, através do Co-Hong (Gonghang 公行), em vão, falar com o mandarim, regressando à Taipa cerca de um mês depois, em 16 de Dezembro. Já em Macau o Comodoro entrega ao Hopu (Hubu 户部) uma carta traduzida para chinês dirigida ao vice-rei de Cantão, ameaçando o oficial da alfândega de Macau que subiria a Cantão no seu barco caso a missiva não fosse entregue ao seu destinatário. Dois dias depois, uma frota de dezoito juncos desce ao Canal da Taipa transportando enviados do vice-rei de Cantão que se encontram com Anson, que, por sua vez, ameaça quer as autoridades chinesas, quer indirectamente a Cidade do Santo Nome de Deus com a força do seu barco de guerra caso essa mesma embarcação não seja reabastecida e reparada. A permissão do vice-rei chega em 6 de Janeiro de 1743, e, em 19 de Abril, encontrando-se o barco pronto para viajar, Anson deixa a rada de Macau, afirmando estrategicamente que se dirige para Batávia para regressar três meses mais tarde, em 11 de Julho, com o galeão espanhol Nuestra Señora de Cobadonga, que tomara nas Filipinas, em 30 de Junho, enquanto este fazia a viagem Acapulco-Manila carregado de mercadoria. O comodoro, lutando novamente contra as exigências dos chineses, dirige-se, três dias depois, à Boca do Tigre, onde pede mantimentos e permanece algum tempo à espera dos mesmos, visitando Whampoa (Huangpu 黃埔) e Cantão até regressar a Macau e partir, posteriormente, após mais uma estada de seis meses nos mares da China, para Inglaterra, onde chega em Junho de 1744. O relato da viagem do Comodoro Anson, atribuído a Richard Walter, capelão do H. M. Centurion, mas redigido, segundo alguns estudiosos, por Benjamin Robins, e publicado em 1748, espelha a atitude inglesa em relação à China, um país considerado intolerante, enquanto a administração mandarínica reforça a vigilância de Macau para evitar a entrada de mais barcos ‘bárbaros’ no Império do Meio através de Macau. O texto atribuído a Richard Walter descreve a estada da tripulação em Macau, e, tal como os autores dos relatos da embaixada de Lord Macartney farão mais tarde, refere a riqueza de que a cidade gozara no início da ocupação portuguesa e a decadência em que então se encontra, permanecendo os portugueses no enclave com autorização dos chineses, que podem, quando o entendem, bloquear a entrada de comida obrigando assim o governador a obedecer-lhes. A obra é traduzida para francês em 1751, ilustrada com uma gravura da cidade vista do mar, onde o Centurion se encontra representado, com base na gravura de Nieuhoff (1665). No que diz respeito às consequências da viagem do Centurion pelo globo e pelos mares da China Meridional, e de entre os muitos exemplos de obras que reflectem e aplaudem o resultado da expedição, John Campbell publica Navigantium atque Itinerantium Bibliotecha: or, A Compleat Collection of Voyages and Travels (1744-1748), na qual glorifica as façanhas marítimas inglesas e descreve o interesse crescente das nações europeias no comércio, sobretudo com a China, servindo-se ainda das muitas inconveniências enfrentadas pelo comodoro Anson em Macau, das dificuldades da circum-navegação e das relações com as autoridades chinesas para provar a capacidade dos ingleses, que futuramente deverão seguir o exemplo do comodoro pelos mares, honrando a Inglaterra. Bibliografia: WALTER, Richard, A Voyage Round the World in the Years MDCCXL, I, II, III, IV, by George Anson, (Londres, 1748); WALTER, Richard, Anson’s Voyage Round the World, introdução e notas de G. S. Laird Clowes, (Londres, 1928); MORSE, Hosea Ballou, The Gilds of China, (Nova Iorque, 1909); MORSE, Hosea Ballou, The International Relations of the Chinese Empire, vol. 1: The Period of the Conflict 1834- 1869, (Londres, 1910); MORSE, Hosea Ballou, The Chronicles of the East India Company Trading to China 1635-1834, vol. 1, (Oxford, 1926); SOMMERVILLE, Boyle, Commodore Anson’s Voyage into the South Seas and Around the World, (Londres, 1934); WILLIAMS, Glyndwr (ed.), Documents Relating to Anson’s Voyage Round the World 1740-1744, (Londres, 1967); WILLIAMS, Glyndwr (ed.), “Anson at Canton, 1743: ‘A Little Secret History’”, in CLOUGH, Cecil P.; HAIR, P. E. H. (eds.), The European Outhrust and Encounter: The Firts Phase (c. 1400-c. 1700), (Liverpool, 1994), pp. 271-290; WILLIAMS, Glyndwr, The Prize of all Oceans: The Triumph and Tragedy of Anson’s Voyage Round the World, Harper Collins, (Londres, 1999); SUMAREZ, Philip, Log of the Centurion Based on the Original Papers of Captain Philip Saumarez on Board HMS Centurion, Lord Anson’s Flagship During his Circumnavigation 1740-44, (Londres, 1973); EAMES, James Bromley, The English in China, (Londres, 1974); LOYD, Christopher, “Introduction”, in SUMAREZ, Philip, Log of the Centurion. Based on the Original Papers of Captain Philip Saumarez on Board HMS Centurion, Lord Anson’s Flagship during his Circumnavigation 1740-1744, (1973), pp. 10-13.
ANSON, BARÃO GEORGE (1697-1752)
CARVALHO, RODRIGO LEAL DE (1932-). Nasceu na Praia da Vitória, Açores, em 20 de Novembro de 1932, tendo vivido parte da infância em Trás-os-Montes e no Algarve, para além dos Açores, onde fez a escolaridade e o Curso dos Liceus. Licenciou-se em Direito (Universidade de Lisboa), ingressando de seguida na Magistratura. Foi colocado na ilha do Pico em 1956 e, no ano seguinte, em S. Tomé e Príncipe, a que se seguiu Macau, onde viverá, se bem que de forma não continuada, cerca de quatro décadas, e a maior parte da sua vida activa. Em 1959 chegou ao Território como delegado do Ministério Público, onde ficou até 1963, ocasião em que foi colocado na Guiné como Juiz de Direito. Nessa qualidade voltou a Macau, em 1966, aqui permanecendo até 1971. Foi então colocado em Luanda, onde esteve ano e meio, sendo depois enviado para Moçambique, onde foi promovido à Relação, e donde saiu em 1975. Após uma curta estadia em Lisboa, na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério do Ultramar, regressou uma vez mais a Macau, em 1976, como Procurador da República, cargo entretanto criado no âmbito do Estatuto Orgânico do Território, e depois designado de Procurador-Geral Adjunto. Nele permaneceu até ser nomeado Presidente do Tribunal de Contas em 1996, lugar que deteve até às vésperas da transferência da Administração de Macau para a República Popular da China, regressando a Portugal ainda em 1999. Por impedimento, pediu, ao ser investido nessas funções, a suspensão dos cargos de curador da Fundação Macau e de membro do Conselho Universitário de Macau, que há anos vinha desempenhando. Rodrigo Leal de Carvalho viu os seus serviços serem reconhecidos pelo Estado português ao ser agraciado, em 1986, com o grau de Grande Oficial da Ordem do Mérito, enquanto que o Governador de Macau o distinguiu, em 1998, com a Medalha de Valor. Se bem que tenha despertado para a escrita ainda nos tempos do Liceu, só em 1993 deu à estampa o seu 1.º romance, Requiem por Irina Ostrakoff, o qual obteve tal aceitação pública que viria a ser reeditado logo em 1995. Galardoado com o Prémio Camilo Pessanha 1993, atribuído pelo Instituto Português do Oriente, foi recentemente (1999) publicado em língua chinesa e objecto da dissertação de Mestrado de Vânia Maria Pinto Coelho Reis. Em 1994 é a vez de publicar Os Construtores do Império, já esgotado, logo seguido, em 1996, de dois outros novos romances: A IV Cruzada, em que o autor em parte se assume como protagonista, e Ao Serviço de Sua Majestade, surgindo, em 1999, O Senhor Conde e as Suas Três Mulheres. Com fina ironia e delicadeza, Rodrigo Leal de Carvalho tem-se revelado um escritor das memórias da cidade de Macau e do universo do funcionalismo português de além-mar das décadas de 1950 e 1960, recreando ambientes e vivências testemunhadas por ele mesmo, sempre devidamente enquadradas no panorama da conjuntura mundial do século XX, o que despertou a atenção de outros investigadores como David Brookshow e Lee Shuk Yee. – Principais Obras. Romance – Requiem por Irina Ostrakoff, 1993 (2.ª ed., 1995); Os Construtores do Império, 1994; A IV Cruzada, 1996; Ao Serviço de Sua Majestade, 1996; O Senhor Conde e as Suas Três Mulheres, 1999. Bibliografia: BROOKSHAW, David, “Macau e os Macaenses: Considerações sobre a Obra de Henrique de Senna Fernandes e Rodrigo Leal de Carvalho”, vol. 2, (Porto, 1999), pp. 169-178; REIS, Vânia Maria Pinto Coelho, A Ironia em “Requiem por Irina Ostrakoff ”, policopiado, (São Paulo, 1999); SENA, Tereza; BASTO, Jorge, Macau nas Palavras, CD-ROM, (Macau, 1998).
CARVALHO, RODRIGO LEAL DE (1932-)
CLAVELL, JAMES EDMUND DU MARESQ DE (1924-1994). Romancista nascido em Sidney, Austrália, filho de um membro da Marinha Real, estuda em Portsmouth e na Universidade de Birmingham (1946-1947) e torna-se oficial de artilharia (1940-1946). É capturado pelos japoneses na tomada de Singapura e permanece na prisão de Changi até ao final da Segunda Guerra Mundial (1941-1945). Em 1953 casa com April Stride, ano em que também se muda para os EUA, tornando-se cidadão americano dez anos mais tarde. A partir de 1954 escreve vários argumentos, sendo também realizador e produtor, e apresenta a sua Tese de Doutoramento à Universidade de Maryland em 1980. O autor publica ro¬mances de temática oriental como King Rat (1962), Tai-Pan (1966), Shogun (1975), Noble House (1981), Whirlwind (1986) e Gai-Jin (1993), daí que à sequência destas obras ou aventuras asiáticas se chame “Asian Saga”. Clavell escreve ainda cerca de dez peças de teatro e realiza seis filmes. A temática dos seus romances assenta sobretudo na necessidade de sobrevivência (económica) do ser humano e no confronto e na partilha (multi)cultural, desde as aventuras do mercador isabelino Blackthorne (William Adams), o primeiro inglês a visitar o Japão e a enfrentar os interesses portugueses e holandeses no arquipélago (Shogun), às estratégias políticas do Tai-Pan escocês (Dirk Struan), que tenta manter a face no seio das comunidades chinesa e inglesa em Hong Kong, em meados do século XIX. O romance Noble House continua a saga de Tai-Pan através da administração de Ian Dunross, herdeiro da banking house e dos negócios marítimos internacionais fundados por Struan, marcando Macau presença nos bastidores através do jogo de influência dos traficantes de ouro. Shogun é adaptado para televisão pela NBC através da série com o mesmo nome. No Japão dos samurais e dos Jesuítas portugueses, Blackthorne luta pela sua vida e pelos interesses comerciais ingleses, defendendo-se dos rivais católicos portugueses e dos mercadores holandeses, presenças constantes na acção do romance. Macau, reduto português numa China fechada ao exterior, é referido diversas vezes como origem e destino da Nau do Trato e de missionários que convertem a população nipónica, ou seja, o enclave no delta do rio das Pérolas é sinónimo de comércio, riqueza e evangelização, bem como de tráfico e comércio de armas com o Japão. O narrador descreve de forma sumária o estabelecimento dos portugueses na cidade, a política do governador e o comércio de ouro e prata desenvolvido por “fidalgos” e Jesuítas entre Nagasáqui e o Império do Meio. O território é ainda representado como centro do poder português e ponto estratégico essencial do império luso. Se fosse possível bloquear o comércio de seda da urbe-fortaleza, esta cairia e consequentemente também Malaca e Goa e todo o Estado da Índia. A Cidade do Nome de Deus torna-se não apenas um referente geográfico mas também cultural para os viajantes europeus que, à distância, desejam penetrar na China, privilégio apenas concedido aos portugueses, que transformam a cidade num símbolo católico do Extremo Oriente através do toque dos sinos, da catedral, do incenso e dos cantos em latim dos Jesuítas, símbolos que se estendem ao mar através da lorcha, fruto da comunhão das tecnologias portuguesa e chinesa em Macau, e igualmente presente em Tai-Pan. A acção deste último romance começa em Janeiro de 1841, com a fundação oficial de Hong Kong, que “destruirá” Macau e marcará o fim de uma era. Muitos dos ingleses estabelecem-se no “rochedo” vindos da segurança do interior das muralhas da Cidade do Santo Nome de Deus, sendo, portanto, forçosa a presença desta no imaginário do romance de fundo histórico, até porque muitos dos funcionários portugueses das firmas ocidentais e os comerciantes parses se deslocam com as mesmas. Macau é representada como lar de personagens como Brock e como teatro neutral dos antecedentes da Guerra do Ópio, onde até então as embarcações ocidentais ancoravam e eram medidas antes de se dirigirem para Cantão, longe dos perigos naturais e dos ataques de piratas. O enclave é também um espaço onde permanecem as residentes do sexo feminino e onde os casamentos entre membros das comunidades de língua inglesa são celebrados na capela protestante, um local de romance e diversão entre as trading seasons. A caracterização directa e indirecta do pintor Aristotle Quance aproxima-o de George Chinnery e a do Reverendo Sinclair de Robert Morrison, enquanto personagens euro-asiáticas como Gordon Chen representam os frutos dos casamentos interaciais entre europeus e chinesas em Macau, onde a “vida secreta”, os prazeres carnais e o tráfico de ópio demoram os britânicos, que aí continuam a manter amantes e esposas antes e após o êxodo para Hong Kong. Imagens típicas e motivos literários associados ao enclave como as cadeirinhas, o Chinese Pidgin English, as tríades, os católicos ou “papistas”, o comércio, os artesãos, a experiência e o conhecimento da tradição e medicina chinesas, as igrejas, as casa mediterrâneas, as calçadas, as praças, os jardins, as fortalezas, a língua portuguesa e o bazar chinês contribuem para a formação da cor local, que caracteriza de forma verosímil o “sonolento” espaço da acção, uma imagem de Macau recorrente nas literaturas de expressão inglesa, cuja focalização ou ponto de vista é sobretudo protestante, portanto, um olhar diferente sob(re) a cidade, na qual a mais velha aliança política europeia é quase sempre recordada para benefício quer da administração quer dos visitantes que se passeiam pela Praia Grande. No final do romance, um tufão acompanha o início de um novo ciclo administrativo em Hong Kong, altura em que Macau, pela estrutura das suas habitações e localização geográfica, se torna um local mais seguro, assumindo-se assim o território como um retiro espiritual, cultural e geográfico para os residentes da recém fundada colónia inglesa que irá gradualmente diminuir a importância mundial do território no âmbito das relações comerciais e políticas sino-ocidentais. Bibliografia: CLAVELL, James, Shogun, (Londres, s.d.); CLAVELL, James, Tai-Pan, (Londres, s.d.); DUUS, Peter, Shōgun: A Guide for Classroom Use, (Stanford, 1980); SMITH, Henry (ed.), Learning from Shōgun: Japanese History and Western Fantasy, (Santa Barbara, 1980); PUGA, Rogério Miguel, “Representação de Macau em Tai-Pan (1966), Shōgun (1975) e Noble House (1981), de James Clavell (1924-1994)”, in Actas do 27.º Encontro da Associação Portuguesa de Estudos Anglo-Americanos(APEAA) , 27th International Conference of the Portuguese Association for Anglo-American Studies: Crossroads of History and Culture (2007).
CLAVELL, JAMES EDMUND DU MARESQ DE (1924-1994)
BEAUVOIR, CONDE LUDOVIC DE (1846-1929). Visita Macau como acompanhante do duque de Penthiève, primo do rei de Portugal por via materna, em 1867, regressando a França nesse mesmo ano, de onde partira, em 1866, para dar a volta ao mundo. Em 1869, o conde de Beauvoir publica Australie et Java, Siam, Canton, em dois volumes, e três anos mais tarde, Pékin, Yeddo, San Francisco, a terceira parte da sua viagem. O viajante chega ao “pavilhão europeu” a bordo do vapor norte-americano Fire- Dart, em 11 de Fevereiro de 1867, e deambula pelas principais atracções turísticas da cidade, incluindo os barracões onde permanecem os cules antes de serem enviados para o continente americano, prática longamente descrita e criticada. Pelas ruas de Macau, Beauvoir compara as casas de granito a prisões, observando macaenses e mestiços no exterior, onde, após o pôr-do-sol, nada há para ver senão os teatros chineses, descritos pelo autor, embora mais tarde, descreva também as casas de jogo da cidade, Mónaco da China e península em forma de uma pegada humana. São ainda referidos e descritos os fortes, as igrejas e os templos da cidade, bem como a Praia Grande, a Gruta do poeta exilado (Camões), no topo da qual se encontra um “observatório”; a paisagem humana adornada pelas mulheres cobertas de mantilhas e a população do território (125 mil chineses, dois mil portugueses). Breves apontamentos históricos referem a fundação portuguesa da cidade; a morte do governador Ferreira do Amaral; as ocupações militares inglesas da cidade (1802, 1808) e a fundação de Hong Kong, que “mata” o antigo entreposto português, antes da descrição da chegada do autor a Cantão, a bordo de uma canhoneira cedida pelo governador José da Ponte e Horta. Bibliografia: BEAUVOIR, Conde de, Voyage Autour du Monde, (Paris, 1869-1870); BEAUVOIR, Conde de, Java, Siam, Canton, (Paris, 1872); BEAUVOIR, Conde de, Pékin, Yeddo, San Francisco, 5.ª edição, (Paris, 1872); LOMBARD, Denis, “O Conde de Beauvoir e Macau (Fevereiro de 1867): Impressões de Macau do Conde de Beauvoir”, in Revista de Cultura, 2.ª série, n.° 23, (Macau, Abril-Junho de 1995), pp. 96-110.
BEAUVOIR, CONDE LUDOVIC DE (1846-1929)
BRASSEY, LADY ANNA ALLNUT ou BRASSEY, LADY ANNIE (1839-1887). Baronesa inglesa (née Allnut), casada com Lord Thomas Brassey, economista político e governador do estado de Victoria (Austrália) entre 1883 e 1885. A família Brassey parte em 1876, no iate Sunbeam, para uma viagem à volta do mundo que duraria onze meses, e Lady Brassey é autora do popular diário dessa mesma viagem Around the World in the Yatch ‘Sunbeam’ our Home on the Ocean for Eleven Months (1878), ilustrado por A. Y. Bingham. A família visita Macau, partindo de Hong Kong no Flying Cloud e a diarista descreve a localização e o aspecto geral do “primeiro estabelecimento na China, que pertence aos portugueses, “outrora uma cidade agradável, com edifícios esplêndidos”. Curiosamente, a autora justifica o aspecto desolado da urbe e a ausência de mercadores com o facto de Macau se situar na rota dos tufões e com o fim do tráfico dos cules, retirando os lusos rendimento dos jogos como o fan-tan 番攤, descrito pela viajante. A ampla mansão onde a família pernoita é minuciosamente descrita, bem como a mobília da mesma, incluindo os mosquiteiros. Durante o passeio de cadeirinha pela cidade até ao farol da Guia, Anna conclui que Macau tem um aspecto totalmente português, com habitações coloridas e uma boa guarda militar, imagem complementada pelo som dos sinos das inúmeras igrejas do território, “estância favorita dos residentes europeus de Hong Kong viciados no jogo.” O texto sugere ainda os sons da Macau nocturna, nomeadamente os tambores dos guardas que passam de hora a hora com duas batidas, intervaladas em meio minuto. Antes de abandonar o enclave a família diverte-se durante um passeio de junco chinês, rumo à ilha de Chock-Sing-Toon, visitando ainda o Jardim de Camões, as ruínas de São Paulo e as demais deixadas pelo tufão de 1874. Bibliografia: BRASSEY, Lady Anna, A Voyage in the Sunbeam, our Home on the Ocean for Eleven Months, (Londres, 1879); BRASSEY, Lady Anna, In the Trades, the Tropics & the Roaring Forties, ilustrações de G. Pearson, (Londres, 1885); BRASSEY, Lady Anna, Lady Brassey’s Three Voyages in the Sunbeam, (Londres, 1887); BRASSEY, Lady Anna, Around the World in the Yatch ‘Sunbeam’ our Home on the Ocean for Eleven Months, ilustrado por A. Y. Bingham, (Nova Iorque, 1889); MICKLEWRIGHT, Nancy, A Victorian Traveler in the Middle East: The Photography and Travel Writing of Lady Annie Brassey (Burlington, 2002).
BRASSEY, LADY ANNA ALLNUT ou BRASSEY, LADY ANNIE (1839-1887)
AUDEN, W. H. (1907-1973). Durante a sua viagem pela China (1937-1938) aquando da guerra sinojaponesa o poeta inglês W. H. Auden (Wystan Hugh Auden) recolhe, na companhia de Christopher Isherwood, impressões para redigir Journey to a War (1939), acabando por visitar Hong Kong, em Fevereiro de 1938, bem como Macau, entrepostos comerciais que descreve comparativamente em dois sonetos em verso branco redigidos em Bruxelas durante o mês de Dezembro de 1938. O poema “Macao” apresenta uma imagem dupla do território, sendo o exotismo e o prazer sem peso do pecado uma das suas principais características, esterótipos facilmente associados ao Oriente pelo turista ou viajante ocidental. Enquanto a comercial Hong Kong não agrada nem a Auden nem ao sujeito poético, Macau, “a weed from Catholic Europe”, ganhou raízes entre as montanhas e o mar. O texto lírico, predominantemente descritivo, apresenta um policromático ‘retrato’ do enclave através das suas casas alegres, um “exótico fruto” que simboliza a singularidade das vivências portuguesa e chinesa da cidade. O olhar protestante do “eu lírico” demora-se nas imagens e estátuas de santos de estilo rococó que prometem salvação aos jogadores, enquanto igrejas se acomodam, lado a lado, com casas de prazer, materialização espacial do “comportamento natural” do ser humano que a fé pode perdoar, imagem esta continuada nos tercetos. Erotismo rima, portanto, com exotismo, através do campo semântico constituído pelos adjectivos utilizados, por entre vielas e edifícios da urbe, recordando os relógios e sinos das altaneiras torres católicas que o inferno poderá esperar os mais temerosos que se entregam aos mistérios do Oriente, rodeados por uma vivência também ocidental. Macau é, como revela o símile botânico utilizado no texto, caracterizado como um “enxerto cultural” ou erva daninha luso-sínica, advindo daí a sua singularidade e o facto de o território representar metaforicamente as fraquezas ‘da carne’ e as virtudes da natureza humana. A dimensão exotica assume no poema uma sugestiva proeminência que se repete no imaginário ‘inglês’ relativamente a Macau e que recompensa o viajante que se depara com a familiaridade da “infantil”, porque inocente, porta de entrada do Ocidente na China. Bibliografia: AUDEN, W. H., Collected Poems, introdução e notas de Edward Mendelson, (Londres, 1991 [1976]); BAKER, Donald C.; BAKER, Elizabeth D., “A Great English Poet on China, Hong Kong and Macao: W. H. Auden and a “Weed from Catholic Europe””, in Review of Culture, 2.ª série, n.º 25, edição inglesa, (Macau, 1995), pp. 241-248; CARPENTER, Humphrey, W. H. Auden: A Biography, (Londres, 1981); DAVENPORT-HINES, Richard, Auden, (Londres, 1995); PUGA, Rogério Miguel, ““Macao” e “Hong Kong” de W. H. Auden: Uma Abordagem Comparativista”, in Administração: Revista de Administração Pública de Macau, vol. 15, n.º 55:1, (Macau, 2002), pp. 325-338.
AUDEN, W. H. (1907-1973)
José Inácio de Andrade nasceu no dia 2 de Novembro de 1780 em Santa Maria, Açores. Faleceu em Lisboa no primeiro dia do ano de 1863. Em Lisboa dedicou-se à vida política activa, tendo sido eleito vereador da Câmara Municipal de Lisboa em 1837. No biénio 1838-1839, Inácio de Andrade ocupou a Presidência da Câmara da capital portuguesa. Posteriormente veio a assumir o cargo de Director do Banco de Portugal. José Inácio de Andrade foi um homem do seu tempo, marcado cultural e ideologicamente por uma visão do mundo humanista e individualista, caracterizadora do pensamento liberal. Erudito e dedicado às letras, Inácio de Andrade escreveu em 1835 dois textos que foram publicados em Lisboa: Memória sobre a Destruição dos Piratas da China e o Desembarque dos Ingleses na Cidade de Macau e sua Retirada e Biografia de Rodrigo Ferreira da Costa. A sua ligação ao Oriente teve início nos primeiros anos de Oitocentos com um conjunto de viagens a Macau e à Índia como capitão de navios. Casou duas vezes e foi à sua primeira esposa, Maria Gertrudes de Andrade, que dirigiu as cartas que escreveu e que reuniu na obra Cartas Escriptas da India e da China, as quais constituem um conjunto de cem breves reflexões, publicadas pela primeira vez em dois volumes pela Imprensa Nacional, em 1843. Ao longo desta obra, o autor revela um conhecimento alargado sobre a China, adquirido através das suas viagens que o mantêm ligado ao Oriente durante vinte anos. Cem cartas recheadas de descrições e reflexões sobre o que ia observando e estudando, e que Inácio de Andrade dividiu em dois volumes. As cinquenta cartas que compõem o primeiro volume centram-se no início da sua viagem até à Índia, nalguns aspectos da civilização indiana, na viagem até Macau e à China e, finalmente, na milenar história chinesa. No segundo volume, composto pelas restantes cinquenta cartas, o autor lança um olhar sobre os diferentes aspectos que caracterizam a civilização chinesa, aproveitando para reflectir sobre outros temas. Estas reflexões ajudam-nos a compreender a sua linha de pensamento, com particular realce para as suas constantes comparações entre o Ocidente e as características do Império do Meio. As viagens realizadas por José Inácio de Andrade exerceram sobre o autor um natural fascínio, levando-o a enaltecer os aspectos mais positivos que foi encontrando no seu contacto com os povos e os lugares que visitou. Mantendo o quadro de valores civilizacionais e de referência do Ocidente visíveis na forma como aborda alguns temas, nas reflexões que elabora e nos autores que utiliza para criticar ou para servirem de suporte às suas análises (Adam Smith, Helvecio, Montesquieu, Voltaire, Abade Reynal, Hobbes, Fernão Mendes Pinto, Gaspar da Cruz, Jerónimo Osório, Tomé Pires, entre outros), Inácio de Andrade faz um esforço no sentido de valorizar o ‘outro’ face a si próprio. Não podendo deixar de sublinhar a erudição e a riqueza multidisciplinar que as Cartas Escriptas da India e da China ainda hoje nos revelam, importa destacar o modo como este autor coloca o seu racionalismo e os seus sentimentos ao serviço da civilização visitada, acabando por se render ao exotismo esmagador de um Oriente que, naquele tempo, ainda estava em grande parte por descobrir. Não obstante os limites que a obra revela, relativamente ao grau de profundidade e de precisão dos conhecimentos que nos transmite sobre as civilizações orientais, as Cartas constituem um objecto de estudo em si mesmas, pela riqueza do texto, pelos sentimentos que nos transmitem e pelas ideias que veiculam: o respeito e a admiração por outras civilizações, pelo diferente, base fundamental em que se alicerçou a secular presença portuguesa no Extremo Oriente. Bibliografia: DIAS, Alfredo Gomes, “As Cartas de José Ignacio de Andrade”, in Macau, n.° 1, (Macau, 2000), pp.78-88; ANDRADE, José Ignacio de, Cartas Escriptas da India e da China, (Macau, 1998).
ANDRADE, JOSÉ INÁCIO DE (1780-1863)
Personagem: | Andrade, Eugénio de, 1923-2000 |
Tempo: | Após o estabelecimento da RPC em 1949 até 1999 |
Desde o retorno à pátria em 1999$1993 |
Fonte: | Dicionário Temático de Macau, Volume I, Universidade de Macau, 2010, p. 91-92. ISBN: 979-99937-1-009-6 |
Identificador: | i0001130 |
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